sábado, 14 de julho de 2012

DELINEAMENTOS DA FUNÇÃO DO CONSULTOR AMBIENTAL


DELINEAMENTOS DA FUNÇÃO DO CONSULTOR AMBIENTAL
 A presente postagem  visa, ainda que de maneira superficial, esclarecer alguns equívocos sobre a figura do Consultor Ambiental, ao mesmo tempo em que valoriza seu importante trabalho.

Duas ou três “palavras sobre a palavra” consultor. Nos idos dos anos setenta, a figura do ‘consultor’, aplicada ao campo profissional, engenharias e outros, gozava de um status elevado. Algo quase pós- sênior. Consultor era aquele profissional chamado para atender a demandas específicas de alta especialidade, e expertise, que o corpo técnico médio não era capaz de solucionar. Posteriormente, em função se uma série de fatores a palavra popularizou-se. Talvez por vergonha ou forma de valorização do profissional de vendas, este também ganhou a alcunha de ‘consultor comercial’, ou ‘consultor de vendas’, quando nada mais é que um vendedor — sem qualquer demérito no fato. Não é raro vermos em cartões de visita de lojas, Fulano de Tal, Consultor Comercial. Já o Consultor Ambiental aqui tratado é uma figura juridicamente distinta de ambos, podendo se aproximar da primeira acepção a depender de sua atuação.

A palavra chave que define e o Consultor Ambiental é independência, técnica e profissional, em relação ao seu contratante. A Res. CONAMA 237  prevê tal independência como obrigatória, sob pena de responsabilização técnica-profissional por dados falsos ou mesmo omitidos. A Resolução anterior, revogada nesse aspecto ia além, e proibia, como forma de assegurar ao máximo essa independência e livrar o consultor de qualquer pressão, que o consultor pertencesse aos quadros trabalhistas do empreendedor. Tal exigência não mais subsiste, porém a Resolução deixa clara a obrigação da independência, imparcialidade e, por conseguinte, dever de lealdade com os estudos realizados ( de se lembrar que éticas até quando dos juramentos quando da diplomação e obtenção grau).

Não é um encaixe perfeito, por razões que se verá a breve trecho, mas uma figura assemelhada ao Consultor Ambiental, e quem pode servir para compreensão do trabalho do mesmo é a do perito judicial. Ora, o perito judicial, presta compromisso, e não é parcial (no sentido de favorecer ou trabalhar em prol de qualquer parte), é antes um ‘expert’ que cumpre função auxiliar ao Juiz, realizando perícia, esclarecendo fatos, pouco importando as consequências para causa se favorecerá ou não A ou B. O que caracteriza o trabalho do perito judicial na compreensão de qualquer pessoa é a sua imparcialidade e a sua especialidade no assunto tratado.

Sob tal aspecto a comparação é perfeita. O Consultor Ambiental também detém especialidade e é imparcial, ainda que contratado pelo empreendedor (primeira diferença). Outro aspecto é que o Perito, o mais das vezes, cinge-se a responder o que lhe foi perguntado, apresentando um laudo pericial capaz de dar ao Juiz melhores condições ao julgamento da causa, sempre em busca da verdade real. Quanto aos quesitos apresentados, o Perito judicial as responde de maneira objetiva, cingindo-se ao que lhe foi perguntado. O Consultor Ambiental, além de diagnosticar e elucidar os fatos do empreendimento em análise pode — e deve— propor soluções, alternativas que apresentem p.e. maior eficácia do ponto de vista de custos, sustentabilidade, conservação ambiental, e que possam ter passado desapercebidas. É a segunda diferença.

Na quase totalidade das vezes os estudos ambientais são realizados por equipes formadas por profissionais de diversas especialidades (para atender as três esferas de conhecimento que compõe o ambiente- física, biótica e antrópica), que se integram a fim de produzir o estudo ambiental. É,  portanto um equipe multidisciplinar, ao mínimo. Desejavelmente tais equipes deveriam ser transdisciplinares, no sentido do maior diálogo possível entre as especialidades diversas, visto  a questão ambiental apresentada ser única. E melhores serão as soluções quanto maior for o diálogo entre os profissionais envolvidos.  Não considero um bom estudo ambiental aquele onde “cada um faz sua parte” e ao final apenas juntam-se os capítulos. Provavelmente ter-se á um estudo ambiental descritivo, e com imensas dificuldades ao Coordenador do estudo em organizar a conclusão. É preciso lembrar que o documento final deve ser uno, e deverá guardar harmonia, tanto em termos de diagnósticos, níveis indicados de aprofundamento , metodologias, justificativas para as conclusões e propostas. Isso diz respeito diretamente a uma questão interna às Consultoras Ambientais, em termos de organização e métodos, onde a maior integração possível é fundamental à qualidade do trabalho.

Outro aspecto por vezes negligenciado é que independente da formação e habilitação técnica do Consultor Ambiental, quando ele atua nesta qualidade deve guardar estrita observância com as exigências antes expostas (imparcialidade, independência, lealdade à técnica, enfim uma ética própria ao Consultor Ambiental). Portanto, em qualquer profissão, entendo que um profissional que atuou como Consultor Ambiental em dado empreendimento está eticamente impedido de atuar no mesmo empreendimento como profissional independente. O que pode representar um problema, considerando que a Res CONAMA não mais exige a figura do Consultor externo. No caso do profissional da área jurídica, ao atuar como Consultor Ambiental, este poderá (p.e.) redigir o capítulo das normas legais. Elencando as normas que deverão ser observadas, identificando passivos, alertando para possíveis problemas que aquele caso concreto poderá vir a ter, dando seu parecer sobre eventuais conflitos de leis, etc. Mas é como se atuasse como bacharel em direito. Por hábito assina-se colocando o nº da OAB (como o fazem os demais profissionais, ao apor os números de seus registros nos respectivos conselhos profissionais). Porém, ao surgir um litígio, entendo que o advogado que atuou como Consultor Ambiental naquele mesmo empreendimento está eticamente impedido de advogar a favor do empreendedor. Pela bastante razão que o Consultor tem o dever da imparcialidade, ao passo que o advogado tem, por definição o dever de parcialidade (no sento etimológico de lealdade à parte que representa). Assim, se ao advogado é lícito argumentar o que lhe é favorável na demanda, não o pode fazer o Consultor, que tem por obrigação o dever de analisar o todo, com os pros e contras, não sendo permitido ao Consultor omitir-se sobre determinado dado que tem ou deveria ter conhecimento. Sequer é preciso buscar (no caso da advocacia)subsídios no Estatuto da Ordem. O bom senso já é suficiente para indicar a obviedade de tal afirmação. É dizer: se o advogado tem interesse em advogar para o empreendedor (porque os honorários são melhores que os pagos ao Consultor ou por qualquer outra razão), que não atue como Consultor Ambiental. O mesmo raciocínio é válido in totum, a qualquer profissional.

O Consultor pode ser chamado a elucidar determinada questão, seja por solicitação do Órgão Ambiental que concederá a licença, seja pelo empreendedor. Poderá ainda ao esclarecer propor soluções (que em regra já deveriam estar contidas no trabalho), mas não poderá, como profissional autônomo, atuar naquele empreendimento, como se representasse dois papéis, uma hora como Consultor, outra como profissional, advogando, ou o que seja. É dizer: o papel do Consultor cinge-se à consultoria prestada, aos estudos ambientais produzidos.  

E se bons os estudos ambientais, mais a figura do Consultor Ambiental se aproximará da primeira acepção do termo. É quando não apenas produz um volume, um estudo ambiental, mas indo além da simples tarefa de “obter a licença”, propõe soluções, demonstra  alternativas desapercebidas, propõe soluções inovadoras, i.e, cria, praticando de fato a boa engenharia, um nível de qualidade superior. ‘Boa engenharia esta’, que infelizmente se vê cada vez mais distante, soterrada por fatores como facilidades da informática (que ao permitir velocidade reduz o pensar); a ‘urgência’ dos empreendedores;  a falta de conato entre os profissionais de meio ambiente com os profissionais dos demais setores produtivos, onde projetos de engenharia e ambiental são vistos e operacionalizados como coisas distintas entre si;  a mecanicidade de alguns Órgãos Licenciadores, dentre outros.

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