segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

NAVEGAR É PRECISO; O MERCADO NÃO.

NAVEGAR É PRECISO; O MERCADO NÃO.
Uma brevíssima análise do mercado de consultoria ambiental nesse fechamento de ano.  A olhos vistos, multiplicaram-se as pequenas empresas de consultoria ambiental, cada qual procurando seu nicho, e naturalmente projetos. Claro que com uma proliferação tão numerosa há de tudo um pouco.  Empresas que estão começando, mas que tem garra e capacidade aprendizado pessoal e institucional. Independente do tempo de vida e do currículo, essas empresas prezam pela qualidade dos trabalhos, e, sobretudo investem no aprendizado constante. Oxalá sobrevivam.
 Em outra banda há as que se acomodarão em um nicho, digamos, confortável, e permanecerão nele, em geral com cunho ‘procedimentalista’.
 Outras empíricas e outras de qualidade questionável — o que é sempre perigoso numa época em que o design e as apresentações maquiam muito do conteúdo real, efetivo.
A pergunta que não quer calar é se há mercado pra tanta gente. De um lado o setor público não ajuda ao não conseguir investir ou deslanchar projetos de infra- estrutura. O nosso comentado ‘pibinho’ é na verdade zero, ou seja,  é um PIB inercial (1).
 Do lado privado as grandes empreiteiras, continuam a ver o meio ambiente como um papel — a famigerada licença ambiental. Obtido esse papel, nada mais importa. E com isso fazem leilões de preços, sem atentar para o fato de que a licença até pode ser obtida, mas muita vez com uma quantidade de condicionantes (folhas e folhas) que multiplicam os custos.  Mas na avidez em se obter a licença e no paquidérmico raciocínio do preço nominal mais barato, em geral não enxergam isso e acabam atribuindo a culpa à burocracia dos órgãos ambientais. Talvez daqui a uns 100 anos façam tais contas e cheguem à conclusão de que sairia mais barato ter contrato aquela outra consultoria.
Uma nova modalidade também entrou em cena recentemente. Preocupados com o custo do papel (uma simples licença na visão dos empresários — claro, não vou dizer que são todos, mas que são bem uns 100% isso são) contratam pequenas equipes de meio ambiente assalariadas. Normalmente capitaneadas por um engenheiro ambiental. Ora, a matéria ambiental é por natureza caso a caso, não dá para dizer a priori o que (ou quem) será necessário para cada projeto, que carrega sempre elementos ambientais próprios. E meio ambiente não se mede por metro. Um pequeno projeto pode ser ambientalmente mais complexo do que um grande empreendimento. Assim contratam mão de obra a baixo custo, felizes por terem reduzido o custo da licença.
Funciona em projetos simples, máxime em órgãos de igual inteligência e que se utilizam de famigerados Termos de referências (que deveria ser o que o nome indica: mera referência (e não modelo para preenchimento), sem prejuízo às peculiaridades do caso)  e o que é pior: “check-list” como rotina prévia à leitura do estudo propriamente (2), e com isso, não raro,  retorna o estudo para (desnecessária) “complementação”, e com perda de tempo, e ainda servindo de triste reforço argumentativo aos que propugnam a ‘burocracia ambiental’.  Já se o projeto for ambiental complexo.....aí a “equipe interna” ou expõe honestamente a necessidade de maior expertise, ou parte para a busca de culpados.
Tirando exceções como a citada (a turma do ‘check list’), na maioria dos casos, o que se chama de burocracia ambiental, nada mais é do que o resultado de estudos ambientais mal feitos (não raro por economia de custos, em obras de milhões). Em caso real, que se tornou piada no meio, um estudo ambiental de uma obra urbana (de competência de análise do Conselho Ambiental Municipal, in casu Belo Horizonte) afirmava taxativamente que não foram encontradas espécies de baleias (citadas inclusive com o nomes científico) na região...... Ufa! Menos mal (o sertão ainda não virou mar). Certamente foram contratados pelo menor preço.  E o “estudo ambiental” (sic) educadamente devolvido para reajustes.
O setor público comprou essa versão, e erroneamente tem passado a exigir em alguns editais que o Coordenador Geral da equipe de meio ambiente tenha de ser graduado em engenharia ambiental. Absoluta ilegalidade em minha opinião. Dormem desatentos os conselhos profissionais, CREA, CAU, Cbio, CRA e outros. Como já dito aqui, a função do Coordenador é tal e qual a do maestro em uma orquestra, não toca nenhum instrumento, mas faz toda a diferença. Qualidades importantes são a visão generalista, experiência e a não-miopia. Quizilas de habilitações mercadológicas à parte (é natural, sobretudo dentro do CREA que abrange várias especialidades  de engenharias que haja uma disputa sobre ‘quem é habilitado para fazer o que’) é ululante que um engenheiro ambiental, por melhor que seja sua formação não terá o domínio completo exigido por um projeto ambiental (exceto se ele também possuir graduação em biologia, eng. Sanitária, florestal, Geologia, arqueologia, e outras mais que cada projeto específico pode exigir (daí o sempre citado ‘caso a caso’)). Menos incoerente (embora igualmente ilegal) seria que tal função fosse dada a um administrador com experiência e capacitação em gestão de projetos. Mas pelo desconhecimento e ignorância no ramo , vale o nome, não a substância.
Mazelas à parte, é certo que quem é bom, sobrevive. A qualidade sempre terá seu espaço, ainda que por vezes maltratada.  Em quadros como esse, criatividade torna-se essencial. E os movimentos são, felizmente, pendulares. Em ritmo aquém do desejado, as empresas contratantes aprendem com os erros, autuações, paralisações de obras, e a dor de bolso. E os projetos ambientais vieram para ficar, ainda que leiloados, ainda que mal compreendidos, e ainda que as ciências ambientais se integrem aos processos industriais e construtivos em ritmo de tartaruga. Mas um dia a tartaruga chega, e vence as lebres mercadológicas.

(1)    Com 40 ministérios,  mais secretárias com status de ministérios, e qualidade técnica deplorável do primeiro ao terceiro escalões, fica mesmo difícil. É óbvio que um projeto qualquer esbarra em N sobreposições de funções, o que não raro gera o fato de se gastar tempo não construindo nada, apenas gerindo a burocracia e os mecanismos de controle. Por isso PACs ‘empacados’ , obras com preços triplicados, etc. Seria essencial ao país (acaso se queira construir um) investir em infra-estrutura, educação e no reaparelhamento das forças armadas, aí incluído a recuperação da nossa indústria bélica (e nesse caso sim, caberia um ministério extraordinário) com redução dos outros 40. Pobre Dilma.
(2)    Um estudo ambiental de ótima qualidade pode ser devolvido p.e, pelo Ibama porque faltou em seu índice a bibliografia ou o glossário..... Coça-me a vontade de colocar nesses casos como bibliografia: “Anotações pessoais” (no prelo). Já o glossário se for colocado em itens de pé de página não serve: não constando no índice é reprovado no ‘check list’.  Um glossário poderia ser exigido p.e num Rima, dada a natureza do documento, que é, grosso modo,  de se traduzir em linguagem leiga o conteúdo técnico, tornando-o acessível (muito embora se a intenção é de tradução, poderia muito bem ser colocada entre parênteses, e até brevemente explicada). Mas nada que um ‘control C-control v’ não resolva – e aí passa-se no inteligente check-list. E ainda há órgãos internos chamados de “Centro de Excelência” (já imaginaram os demais?).